O presidente Jair Bolsonaro perdeu uma grande oportunidade ao focar sua fala na ONU em seus eleitores, fazendo um discurso agressivo, tomado pelo sentimento da guerra fria, totalmente fora de época, e usou o plenário mais privilegiado do mundo para fazer um acerto de contas com uma lista de supostos inimigos. Aquele ambiente não é para esse tipo de manifestação. Bolsonaro deveria ter aproveitado para romper o isolamento em que o país está numa questão diplomática central no mundo, que é o combate à emergência climática.
Aquele era o fórum para convencer, especialmente os membros da União Europeia. O acordo de livre comércio não está garantido, precisa ser ratificado pelos parlamentos de cada país do bloco. Essa era a hora de dar mais garantias, de tranquilizar os parceiros. Era preciso apresentar dados e reforçar o compromisso do Brasil com o meio ambiente. O tom adotado não ajuda em nada na aprovação do acordo lá fora. Perdeu uma grande oportunidade.
Bolsonaro dedicou metade de seu tempo para atacar e demonizar o “socialismo”, guerra que já não existe mais no mundo há pelo menos uns 30 anos, desde que o muro de Berlim foi derrubado. Em seguida, ocupou um longo tempo para criticar Cuba, uma pequena ilha que não há de ser um adversário de um país continental como o Brasil. Logo após, criticou a Venezuela e seu sistema de governo (frise-se que é um regime autoritário), mas que pouco ou quase nada intervém com o Brasil. Houve também ataques indiretos à França e acusações frontais às ONGs e à imprensa, especialmente a escrita e televisada. Ou seja, o presidente do Brasil se apresentou no principal palco do mundo como uma pessoa repleta de inimigos, ressentimentos, raiva. Na questão indígena investiu contra o cacique Raoni, um líder indígena de 89 anos.
Aquele é um ambiente onde a serenidade é bem-vinda e o tempo deve ser utilizado para construir pontes nas quais passarão os diplomatas para fazer acordos e parcerias. E apontar princípios que defenderá nas negociações bilaterais. Seu discurso sobre a Amazônia
não ajudou a derrubar a impressão de que está havendo falta de controle no desmatamento. Bolsonaro apenas repetiu o que vem dizendo, sem qualquer evidência ou dados. O grande prejudicado com isso por certo deverá ser o setor do agronegócio exportador, que precisa que seus clientes internacionais possam ampliar os negócios com o Brasil sem a pressão dos seus mercados consumidores. Em suma, o presidente leu um discurso que deve ter sido escrito por quatro ou mais mãos, e em que pese parecer ter se portado como um Dom Pedro I, que brandindo a espada em 1822 disse: Independência ou Morte! Garantiu que em seu governo, o país alcançará o progresso desejado, que segundo disse, acabou perdendo nos últimos 20 anos. Jair Bolsonaro enfrentou o plenário do mundo, a Assembleia Geral das Nações Unidas, do único jeito que ele sabe: com extrema agressividade, batendo para não levar, atacando para não ter que encarar os diversos temas com a serenidade e a seriedade que eles exigem.
De Venezuela e Cuba aos governos de seus antecessores, passando pelas ONGs e pela mídia, todos apanharam perante uma assistência internacional perplexa que, ao final, ouviu passagem da Bíblia. A Amazônia não é patrimônio da humanidade nem pulmão do planeta, decretou o presidente brasileiro, esbravejando contra as minorias. E a ideologização está levando aos lares e à célula máter da sociedade, a família, questões indevidas como as de gênero. Sim, foi isso mesmo que todo mundo ouviu.
O que se pergunta agora é quais serão as consequências internas e externas do novo capítulo da novela, “Bolsonaro contra o mundo”. Certamente irão além das brincadeiras sobre o presidente biruta do Brasil. Investidores costumam ficar desconfiados de países governados por líderes assim, é um provável desdobramento será mais um passo rumo ao isolamento internacional do Brasil. Como diria o poeta Mário Quintana: “o tempo passa, eu passarinho”! Só depois que o tempo passar é que poderemos afirmar quem estava errado!
Radialista e Jornalista Profissional desde 1979 – Registro no MTF/PR Nº 0888 – Foi diretor de imprensa em prefeituras no Paraná e Santa Catarina. Atualmente aborda assuntos com foco no contexto do cenário político brasileiro e mundial. Como colunista de O Povo, traz análises e notícias exclusivas dos bastidores de temas diversos e relevantes para os catarinenses.
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