CUECA TEM REPLAY

Jornal O Povo SC
Dinheiro na cueca

O senador Chico Rodrigues, DEM, cuja história entrou para os anais da história escura da política brasileira ao tirar 121 dias de licença do Senado, tão logo foi pego com uma grande quantia de dinheiro na cueca.

Assim, a decisão do ministro Barroso de afastá-lo do cargo, por 90 dias, foi suspensa pelo próprio ministro, por ter-se tornado desnecessária. Mas o importante nem foi isso: é que, licenciando-se por 121 dias (um tapa na cara do brasileiro), um senador automaticamente passa o cargo ao suplente. E vejam só, no caso, o suplente é Pedro Arthur Ferreira Rodrigues, também do DEM, filho de Chico Rodrigues e herdeiro do pai, pelo menos temporário, de seu mandato. E passa a desfrutar das mordomias do cargo, dando crédito à clássica frase “a família é a base da sociedade”. E ninguém, claro, criticará tão belo exemplo de solidariedade entre pai e filho. Pai que teve que inventar uma historinha para justificar a grana toda em lugar inapropriado. Disse que o dinheiro era para pagar empregados seus. Ora bolas!

Mas essa história, claro, não termina por aqui. Mesmo com Chico Rodrigues insistindo em dizer que o dinheiro localizado no insólito esconderijo era destinado ao pagamento de seus empregados. Vá lá, vá lá – mas que é que pode ocorrer se suas empresas crescerem, graças a seu trabalho e seu tino gerencial, e contratarem mais funcionários? Chico Rodrigues, em vídeo que enviou aos senadores, também disse que, ao enfiar o dinheiro no providencial esconderijo sob suas cuecas, tomou “a decisão mais irracional de sua vida”. Engano: a decisão mais irracional de sua vida foi candidatar-se; e a de seus eleitores, dar-lhe o voto. Mas aceitemos. Só que, quando alguém está prestes a ser preso, costuma mastigar e engolir as provas.

Senador pego com a boca na botija

QUEM TOPA A APOSTA?

Como colunista, aposto que daqui a 120 dias, não vai acontecer nada com o senador Chico Rodrigues. Daqui a 240 dias, ou 360, também não. Mas a aposta só vale se a Polícia Federal sair de cena. Lembrando a frase imortal de Mané Garrincha, “falta combinar com os russos”. Não esqueçamos que o senador era um dos líderes do governo, portanto, assim com Bolsonaro. Tirando a Polícia Federal, todos os demais envolvidos no caso, ou os que deveriam envolver-se, vão deixar claro que não é com eles. Por que os senadores iriam se mexer, abrindo caminho para que o STF tome a decisão de afastar outros que forem suspeitos de crime? E quem pode atirar a primeira pedra? Se a Federal mantiver as investigações, aí as coisas mudam: sai o senador Cofrinho, entra o senador Cofrinho Jr.

Bolsonaro afastou senador pra não se complicar

NESSA HORA NÃO HÁ SANTOS

Em princípio, o pacote comercial acertado entre Brasil e Estados Unidos ERA uma ótima notícia: desburocratizaria as trocas entre os dois países, reduziria as restrições, abriria caminho para, no futuro, um verdadeiro acordo de livre comércio. Mas é preciso ver se, na prática, o acordo não seja apenas a contribuição brasileira para mostrar que a política externa do presidente Trump, a duas semanas das eleições americanas, funciona bem. Os exemplos anteriores não chegaram a ser brilhantes: o Brasil, que produz álcool de cana (mais barato que o álcool de milho americano), abriu o mercado para importar álcool dos EUA, sem tarifas, mas o açúcar brasileiro continua enfrentando barreiras. Bolsonaro deu todas as demonstrações de deferência para com Trump, recebeu promessa de apoio à entrada do Brasil na OCDE, Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, mas até hoje continuamos fora. O filho 03 de Bolsonaro, aquele que queria ser embaixador em Washington, chegou a usar bonés eleitorais de Trump, mas os EUA, rompendo longa tradição, resolveram apresentar candidato à presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento, para isso afastando o candidato brasileiro. Em resumo, até agora houve muito toma lá e pouco dá cá. Continuamos “capachos” de Trump, sem perspectivas de que isso venha a mudar.

Donald Trump adulando o presidente brasileiro

MAS NEM TUDO TEM QUE SER RUIM

A única coisa efetivamente concreta que aconteceu na visita da delegação dos EUA ao Brasil foi a assinatura – pelo ministro Paulo Guedes e a presidente do Eximbank (banco de importação e exportação), Kimberly Reed – de um memorando sobre abertura de financiamento de produtos americanos, até um bilhão de dólares. É bom; mas no momento é melhor para os EUA do que para o Brasil. O Governo americano faz pressão forte e aberta para que o Brasil não permita a participação da chinesa Huawei na licitação da faixa de 5G de telecomunicações, prevista para o ano que vem. Como a Huawei já tem ampla participação nas telecomunicações do país, afastá-la pode fazer com que nossa Internet, já caríssima, fique ainda mais cara, com a troca de sistemas inteiros que hoje integram a rede. Os EUA já falaram em financiar a troca (e sem exigir que a Qualcomm americana seja beneficiada: aceitam também a finlandesa Nokia e a sueca Ericsson). Só não querem a Huawei. Teimosia e implicação de Trump. Ainda bem que “parece”, seu reinado está chegando ao fim.

Tecnologia chinesa causa briga China/EUA

O primeiro problema é que neste momento a Huawei é a líder mundial da tecnologia 5G, seguida por Nokia e Ericsson, e só então vem a americana Qualcomm. O segundo problema é mais sério: a China é hoje o maior parceiro comercial do Brasil. Afastar da concorrência a sua representante poderia gerar algum tipo de retaliação – até porque o que se levanta contra a Huawei é a possibilidade de que o Governo chinês utilize a rede para fazer espionagem. Boicotar a Huawei significaria, em outras palavras, desconfiar do maior parceiro do país. Mas quem disse que nosso presidente não vai boicotar?