Antes de iniciar a coluna de hoje quero esclarecer ao amigo leitor que as coisas nem sempre são o que parece. Dentre todos nós, talvez este colunista seja aquele que com maior experiência e mais vivência sobre tudo que ocorreu no Brasil nos últimos 60 anos.

Desde a eleição de Jânio Quadros, passando por João Goulart, os presidentes militares, Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula, Dilma, Temer e agora Bolsonaro. Mesmo àquela época, onde tudo conspirava para que os militares agissem de alguma forma mais firme para contar a onda de incertezas que grassava no Brasil. Nada, porém, que se compare aos dias atuais, onde temos na presidência da República um cara inseguro, anormal, que uma hora diz uma coisa, noutra rediz o que disse. Um verdadeiro “não sabe se vai ou se fica”! Então, leiam com atenção e apontem onde estão os erros. Mas o façam com a razão, não com o coração…

O RETORNO DE JOHANN STRAUSS

Pra contar todo esse imbróglio é necessário que abordemos uma série de itens que demonstrem o que estamos vivendo nesses dias de pandemia e de incertezas no nosso País. Vamos começar falando do criador da Microsoft, Bill Gates, um dos homens mais ricos do mundo, que se dedica hoje a distribuir sua fortuna, por meio da Fundação Bill & Melinda Gates. A Fundação paga as pesquisas de um laboratório, o Inovio, em busca da vacina para o coronavírus. Gates criticou o presidente Donald Trump por ter bloqueado a liberação da parcela americana no orçamento da OMS, Organização Mundial da Saúde. Gates, a rigor, não defendeu a OMS, cujo presidente foi eleito com patrocínio da China e onde a China tem poderosa influência, mas disse que este momento de pandemia não é adequado para brigar por dinheiro. Resultado: está sendo ameaçado de morte pela Internet. Lá como cá. Pesquisadores da FIOCRUZ, Fundação Instituto Oswaldo Cruz, que fizeram um teste com a cloroquina em Manaus, estão sendo ameaçados de morte por ter dito que, num grupo de 83 pacientes em estado grave, tratados com a cloroquina – remédio defendido pelo presidente Bolsonaro – morreram onze. Os pesquisadores são acusados pelos doidos virtuais de ter dado doses altas demais de cloroquina aos doentes. Na verdade, havia dois grupos, um que recebeu doses mais altas, outro que recebeu doses menores. Houve mortes nos dois grupos. Nada que inviabilize a cloroquina (ou sua parente) a hidroxicloroquina, para mais pesquisas com outros remédios associados. Mas parece que os doidos decidiram que quem não decreta que as duas drogas são a solução está conspirando para derrubar o presidente.

Bill Gates – criador da Microsoft

ALINHADO, PERO NO MUCHO

Bolsonaro nomeou novo ministro da Saúde, o médico Nelson Teich, que se disse alinhado ao presidente, mas que manteve a quarentena. Bolsonaro, logo após a posse de Teich, criticou mais uma vez o isolamento social, criticou de novo os governadores que determinaram a quarentena, disse que as pessoas não devem ficar em casa e que as crianças devem voltar à escola.

OS 4 DO APOCALÍPSE

O Financial Times, um dos mais importantes jornais do mundo listou os dirigentes internacionais que compartilham a tese da “gripezinha” defendida por Bolsonaro e se recusam a levar o coronavírus a sério: são Alexander Lukashenko, da Belarus; Daniel Ortega, da Nicarágua; e Gurbanguly Berdymukhamedov, do Turcomenistão. Detalhe: Ortega, da Nicarágua, é de extrema esquerda, foi guerrilheiro apoiado por Cuba e é aliado de Lula. Os outros são ditadores… O 4º é Bolsonaro.

AVES DE MAU AGOURO

Este grupo, Ortega, Lukashenko, Berdymukolamedov e Bolsonaro é chamado pelo Financial Times de “Aliança do Avestruz”, baseado na lenda de que avestruzes enterram a cabeça na areia para não ver o perigo – o nome do grupo foi criado no Brasil, por um professor de Relações Internacionais da FGV – São Paulo, Oliver Stuenkel. De fato, avestruzes escondem a cabeça para não serem vistos, já que seu corpo é da cor do solo. Mas confirmam um antigo ditado português: “Quanto mais se abaixam, mais o rabo se lhes vê”. Os portugueses não usam a palavra “rabo”, substituem-no por um sinônimo monossilábico.

REPENSAR NÃO FAZ MAL

Encerrado o episódio Mandetta – que, em princípio, deve se preservar para outros voos, evitando filiar-se à oposição aberta ao presidente – o novo adversário de Bolsonaro foi escolhido: Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados. Foi Maia que conseguiu aprovar a reforma da Previdência, o que irrita Bolsonaro desde aquela época. Como se atreveu a brilhar mais do que ele? Maia pode atrapalhar muito os passos do Governo, que até hoje não tem boa relação com o Congresso. Não faz mal: Bolsonaro não vive sem um inimigo para chamar de seu. Diz que Maia – por ter conseguido, em votação massacrante, aprovar um substancial auxílio federal aos Estados, que devido à pandemia perdem boa parte da arrecadação – “está conduzindo o Brasil para o caos”. E – textualmente – “parece conspirar e querer me tirar do Governo”. Bateu duro: “Quando você (Maia) fala em diálogo, a gente sabe qual é o seu diálogo, então esse tipo de diálogo não vai ter comigo”. A resposta de Maia é que Sua Excelência o critica para desviar a atenção da saída do ministro Mandetta. E prometeu reagir às pedradas de Bolsonaro “com flores”, rosas com espinhos, talvez.

O ATO DE (IN) PENSADO DE BOLSONARO

O “presidente” Jair Bolsonaro voltou a desafiar as recomendações de autoridades sanitárias e compareceu a um ato em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília, no último domingo. O presidente discursou para os manifestantes que, entre outras coisas, pediam o fechamento do Congresso e do STF, intervenção militar e a volta do AI-5. Disse: “Nós não queremos negociar nada”! A participação de Bolsonaro no ato antidemocrático provocou reações entre a classe política. Três ex-presidentes, governadores, ministros do STF e Rodrigo Maia criticaram a manifestação e saíram em defesa da democracia. Enquanto isso, a Covid-19 segue matando muita gente no país.

O presidente Jair Bolsonaro provocou aglomeração ao discursar de improviso para uma multidão em Brasília, na tarde de domingo (19), Dia do Exército. (Photo by EVARISTO SA / AFP)

MINISTRO ESTREIA EM MEIO A ISSO

Em seu primeiro compromisso oficial como ministro da Saúde, Nelson Teich afirmou que a adoção de testagem em massa de brasileiros não representa, por si só, uma solução, mas ajuda no planejamento de políticas públicas para fazer frente ao coronavírus. Teich participou de uma videoconferência com autoridades sanitárias de países do G-20, que contou também com a presença do diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanon. O novo ministro, inclusive, defendeu a importância de órgãos como a OMS e seus primeiros passos mostram uma política semelhante à de Mandetta. Resta saber quais serão os próximos passos e se o presidente não vai se intrometer.

A COVID E OS TIPOS SANGUÍNEOS

Um estudo preliminar feito por pesquisadores chineses indica que pessoas pertencentes ao tipo sanguíneo A são mais suscetíveis à infecção e apresentam mais risco de morte por Covid-19, enquanto pessoas do tipo O correm menos risco. Membros de cinco universidades compararam a distribuição dos tipos sanguíneos entre a

população das regiões de Wuhan e Shenzen com a variação entre 2.173 pessoas infectadas com Covid-19 nessas localidades. Os próprios cientistas, porém, ressaltam que o material ainda não deve ser usado para orientar as práticas clínicas, mas pode incentivar uma investigação sobre a relação entre grupos sanguíneos e a doença.

EUA: MAIS DE 40 MIL MORTOS

Na terra do Tio Sam aumentam as mortes. O número de vítimas fatais causadas pelo novo coronavírus nos Estados Unidos saltou de 30 mil para 40 mil em quatro dias. No país, quase 60% da população está mais preocupada com a saúde do que com a economia. Os EUA têm, ainda, mais de 759 mil casos confirmados de Covid-19. O segundo país com mais infectados no mundo é a Espanha, que bateu a marca de 200 mil. A segunda nação em número de mortes, no entanto, continua sendo a Itália, com 23,6 mil óbitos. Em toda a Europa o novo coronavírus já matou mais de 100 mil pessoas, e o contínuo avanço da doença pelo mundo mostra que ainda não é hora de relaxamento.

BOLSONARISTAS PEDEM VOLTA DO AI-5

Bolsonaristas foram às ruas no domingo (19) não apenas pedir o fim do isolamento social, contrariando a Organização Mundial da Saúde (OMS), mas também com o objetivo de protestar em favor do AI-5, que, em 1968 resultou no fechamento do Congresso, na intervenção em estados e em municípios, cassações de mandatos e em mais tortura e censura. O deputado federal Eduardo Bolsonaro também defendeu o AI-5 em outubro do ano passado, argumentado que a esquerda poderia radicalizar na oposição ao governo do seu pai. “Tudo é culpa do Bolsonaro. Se a esquerda radicalizar nesse ponto, a gente vai ter que dar uma resposta. Uma resposta que pode ser um novo AI-5. Alguma resposta será dada”, disparou ele.

BARROSO: FATO É ASSUSTADOR

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse domingo (19) que é “assustador” ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. Barroso foi o primeiro ministro do STF a se manifestar publicamente sobre o protesto, que contou com a presença do presidente Jair Bolsonaro. Ele disse que só pode desejar intervenção militar que perdeu a fé no futuro e sonha com um passado que nunca houve. Ressaltou que ditaduras vêm com violência contra adversários, censura e intolerância, e que pessoas de bem que amam o Brasil não desejam isso.

BOLSONARO CRUZOU A LINHA

O presidente Bolsonaro tem feito jus à biografia de um político radical que construiu a carreira na bancada do baixo clero na Câmara sem nunca ter se preocupado em se distanciar do lado mais escuro da ditadura militar. Eleito legitimamente presidente da República, Jair Bolsonaro tem sido coerente com seu passado e, à medida que se sente legalmente tolhido a praticar um enfrentamento sem base científica da epidemia da Covid-19, radicaliza, tendo chegado a um ponto perigoso ao participar de manifestação em Brasília, quando se pregou golpe militar – apontou o jornal O Globo em editorial publicado segunda-feira.

QUEREMOS STF E CONGRESSO ABERTOS

Um dia após se juntar a um ato em defesa de um golpe de estado, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) rebateu as críticas e defendeu que o Congresso Nacional e o STF (Supremo Tribunal Federal) sempre estejam “abertos e transparentes”. “Supremo aberto e transparente. Congresso aberto e transparente. Nós, o povo, estamos no governo”, afirmou na manhã de segunda-feira ao deixar o Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência. Segundo ele, as acusações de que teria manifestado uma postura autoritária são “provocações baixas e rasteiras” por parte da imprensa. Também as rotulou como “invencionice”. Omitiu ou nem lembrou o Dia do Índio (19/4) e também não tocou na data histórica de Tiradentes que se comemora neste dia 21 de abril.

No ato de domingo, em que manifestantes pediram intervenção militar, a volta do AI-5 (Ato Institucional Nº 5) e o fechamento do Congresso e do STF, Bolsonaro discursou e provocou mal-estar com os demais poderes, além de deixar os militares irritados. Após se juntar ao protesto, o presidente afirmou: “Não queremos negociar nada”. O gesto foi interpretado em Brasília como uma manifestação de autoritarismo.

Na segunda de manhã, como faz costumeiramente ao deixar o Palácio da Alvorada, Bolsanaro falou com seus apoiadores tentando mudar o tom. “Não falei nada contra qualquer outro poder. Muito pelo contrário. Queremos voltar ao trabalho. O povo quer isso. Estávamos lá saudando o Exército brasileiro. É isso, mais nada. Fora isso, é invencionice. Tentativa de incendiar uma nação que ainda está dentro da normalidade”, retrucou, lembrando que a mobilização ocorreu na data em que era comemorado o Dia do Exército.

Questionado sobre a bandeira de retorno do AI-5, gritada a plenos pulmões por alguns apoiadores, mais uma vez o presidente retrucou: “Isso aí o pessoal pede desde 1968”, em referência ao ano que foi editado o decreto que iniciou o período mais duro da ditadura militar. “Todo e qualquer movimento tem gente infiltrada, tem gente que tem a sua liberdade de expressão. Respeite-se a liberdade de expressão”.

Arrependido ou talvez preocupado, Bolsonaro volta atrás e diz que não disse o que disse. Foto Antonio Cruz/Agencia Brasil

Bolsonaro ainda se irritou com um dos apoiadores que se aglomeravam na portaria da Alvorada. Enquanto o presidente fazia o seu pronunciamento, o homem gritou: “Fecha o STF”. Irritado com a repercussão negativa de sua participação no protesto de domingo, o mandatário advertiu: “Aqui não tem fechar nada. Dá licença aí. Aqui é democracia. Aqui é respeito à Constituição brasileira. E aqui é a minha casa e a tua casa. Então eu peço, por favor, que não se fale nisso aqui”. “Eu sou realmente a Constituição. E mais: tenho conduzido o Brasil sempre bem orientado e fiel aos interesses do povo brasileiro. Nada eu faço que não esteja de acordo com eles. É isso que acontece comigo. Onde é que eu estou errando? Meu time não trabalha de madrugada, meu time trabalha à luz do dia”. Então, senhor presidente, faça o que diz e não cometa mais nenhum desvio de conduta!