Há um importante grupo no Governo Federal – chamado genericamente de área militar, embora nem todos os militares que estão no Governo pertençam ao grupo, embora nem todos no grupo sejam militares – que se preocupa com o desgaste político do presidente. Quando até Olavo de Carvalho ameaça derrubar o Governo, quando a prisão de um tal “Queiroz”, confessadamente adepto de práticas pouco ortodoxas de arrecadação ameaça atingir a própria família do presidente, o grupo quer reverter a situação com um Ministério de Notáveis. O nome – como se recorda – foi criado no Governo Fernando Collor, com o mesmo objetivo, e realmente houve a ocupação de ministérios por pessoas notáveis. Mas não adiantou: Collor sofreu impeachment – e mais tarde acabou acusando os notáveis de traição.
UM GUPO DE NOTAVEIS II
Acontece que o presidente Bolsonaro já formou um Governo de notáveis. O ministro do Meio Ambiente patrocinou uma bela afrouxada na fiscalização ambiental, os dois ministros da Educação que se sucederam foram notáveis pela despreocupação com problemas educacionais, o terceiro ministro da Saúde em menos de um ano e meio não tem experiência no assunto – mas tudo bem, ele aprende, basta esperar algum tempo e assistir mais alguns milhares de mortes na pandemia – e até agora só se cercou de militares, sem se contaminar com a presença de especialistas em saúde pública. E há a ministra Damares Alves – querem figura mais notável? O chanceler pediu o apoio dos EUA ao candidato brasileiro ao BID, o tal de Weintraub, para derrotar a Argentina. Trump não deu apoio e ainda lançou candidato próprio. O Itamaraty agradeceu. “Perdoa-me por me traíres”, diria Nelson Rodrigues.
UM GRUPO DE NOTÁVEIS III
Mas há Paulo Guedes, o Posto Ipiranga. Das três reformas que achava essenciais e urgentes, uma, a da Previdência, foi aprovada graças a Rodrigo Maia e David Alcolumbre, e era diferente da que propôs. A administrativa está passando numa boa – numa boa temporada nas gavetas de Bolsonaro, onde está há um ano. A tributária será proposta algum dia. A propósito, não botemos a culpa da pandemia: de janeiro de 2019 a março de 2020, houve tempo. Mas Bolsonaro preferiu, entre outras coisas, analisar esteticamente a esposa do presidente francês. E o Posto Ipiranga se calou, se tornando o “posto do sossego”.
CONSEQUÊNCIAS NOTÁVEIS
As ações do notável Ministério provocam problemas também notáveis: um dos mais graves é dificultar o acordo Mercosul e União Europeia, colocando em risco o comércio já existente entre os europeus e o Brasil. Menos pelas queimadas na Amazônia e mais pelas declarações de que isso não tinha importância, o Brasil sofreu bloqueio de recursos europeus destinados à preservação. Somem-se a isso frases de Bolsonaro sobre reservas indígenas e o afrouxamento da fiscalização ao desmate ilegal – antes, equipamentos usados em desmatamento ilegal eram incendiados. Agora, são devolvidos – e há restrições de parlamentos de países europeus ao acordo. A Europa se beneficiaria com ele – estima-se que suas empresas poupariam € 4 bilhões ao ano. Mas é fácil boicotar o acordo: a imagem internacional de Bolsonaro é ruim – basta ver como é tratado pela imprensa europeia -, e o lobby dos agricultores europeus contra o agronegócio brasileiro, com o qual não conseguem competir, usa isso contra o Brasil. Tirando a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, ninguém dialoga com os clientes. Aliás, ela está fazendo bem o seu papel… mas, parece uma das únicas vozes em favor do País.
MENTIRA OU VERDADE?
Fabricio Queiroz, amigo de Bolsonaro, assessor de seu filho Flávio, foi preso na casa de Atibaia de um advogado de Flávio. Não estava escondido, mas hospedado: não havia nenhuma ação legal contra ele. Mas o advogado, em várias entrevistas, disse não saber onde ele estava. Aliás, se é do Rio e se tratava de câncer em São Paulo – onde a revista Veja o entrevistou, no Hospital Albert Einstein -, por que foi morar em Atibaia, a 60 km de distância? O presidente Bolsonaro disse que é porque a casa do advogado ficava perto do hospital onde se tratava. Enganou-se: o Hospital Nova Atibaia, onde ele disse fazer o tratamento, negou essa informação. E o Einstein fica longe: dá uns 80 km, com o trânsito paulistano no caminho. Outra dúvida: se Bolsonaro e Flávio não tinham contato com Queiroz, como o presidente sabia do hospital de Atibaia? E por que surgiriam a respeito dele tantas invenções? Questão de hábito? Debaixo desse angu, claro que tem caroço!
PAU QUE DÁ EM CHICO…
Boa parte da argumentação bolsonarista nas redes sociais se refere ao caso Queiroz como perseguição política. Havia 20 gabinetes parlamentares que, segundo o Coaf, tinham movimentação financeira atípica. Flávio Bolsonaro era o 19º da lista, com R$ 1,3 milhão – Queiroz era o operador. Mas, para que ninguém alegue que não falei de flores, a lista era encabeçada pelo gabinete de um deputado petista, André Ceciliano, com 49,3 milhões. Mas também é natural que um assessor do filho do presidente eleito fosse mais citado que os demais. O mais justo seria que contra todos os envolvidos na lista houvesse um inquérito semelhante. Justiça é Justiça, sem perseguir ninguém, mas sem deixar ninguém de fora… Pau que dá em Chico, também dá em Francisco!
Radialista e Jornalista Profissional desde 1979 – Registro no MTF/PR Nº 0888 – Foi diretor de imprensa em prefeituras no Paraná e Santa Catarina. Atualmente aborda assuntos com foco no contexto do cenário político brasileiro e mundial. Como colunista de O Povo, traz análises e notícias exclusivas dos bastidores de temas diversos e relevantes para os catarinenses.
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